A reputação que vem de dentro

Clima Organizacional
Funcionários orgulhosos de suas empresas têm poder de expandir o alcance reputacional das organizações e de suas marcas – quase na mesma proporção de destruí-lo por parte daqueles cujos interesses se restringem ao pagamento e ao fim do expediente

Uma pesquisa realizada recentemente pela Ação Integrada em parceria com a Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial) mostrou os principais desafios das áreas de comunicação interna das empresas: fortalecer cultura e orgulho em um ambiente que valorize o colaborador (93%) e criar clareza em torno da estratégia de negócio engajando os colaboradores nesta jornada (79%). A maior dificuldade neste percurso é engajar lideranças como comunicadores (64%).

Fonte: Pesquisa de Tendências em Comunicação Interna – https://acaointegrada.com.br/estudosrealizados/

Claro que, apesar de colocadas na perspectiva da atividade e de processos de comunicação interna, as missões prioritárias da área não se restringem a ela. Cultura e orgulho são construções multifacetadas de amplo alcance. Tornar o modo de fazer as coisas e perpetuá-lo (cultura), e tornar isso uma fonte de orgulho (ou de prazer) é uma responsabilidade muito além da comunicação. Envolve diversos atributos, construídos com cuidado e atenção a detalhes muitas vezes despercebidos.

Uma dica está dada na própria análise da pesquisa – primeiro pensar, ou entender, o que as pessoas querem saber, para depois alimentá-las com essas informações, para então pensar no que a empresa quer falar. Para pensar, ou entender as pessoas, a maneira mais fácil é questioná-las até descobrir, não?

Imagine o que alguém que se candidata a uma vaga pensa quando chega na empresa.

  • Conhece a marca?
  • Sua recepção na entrada é agradável?
  • Aguarda horas por uma entrevista? O mesmo vale para toda sua convivência pós-contratação.
  • O time é feliz? Por quê? Se não é, o que incomoda?
  • A pessoa age por medo ou por recompensa?

Parece simples, mas não é. Nem sempre sequer a própria pessoa consegue expressar detalhes cruciais de seus próprios sentimentos e emoções e o que pode fazer dela um porta-bandeira de sua marca pela vida afora. Um de nossos sócios percebeu, em uma ocasião, o valor do “orgulho de pertencer” quando entrevistou um candidato a emprego. O interessado havia se movimentado do Rio de Janeiro a São Paulo, certamente com interesse, e chegou à entrevista portando uma pasta executiva com um enorme logotipo da Coca-Cola. Ele nem trabalhava mais lá, mas se exibia querendo impressionar a torcida.

Por óbvio, esse orgulho decorrente da passagem do fulano pela centenária gigante norte-americana não foi criado com mecanismos de comunicação interna, mas sedimentado por uma reputação construída interna e externamente à companhia.

O desafio pode ser ainda maior em empresas business-to-business, familiares e de menor porte, ou de setores que via de regra se comunicam menos com seus públicos. Mas não são insuperáveis. Quando a exigência com qualidade se espelha em questões como, digamos, seleção de matérias-primas, respeito ao subordinado, formato de atendimento ao cliente ou pagamentos pontuais, isso passa mensagens tão ou mais fortes do que qualquer comunicado pode alcançar.

Outra pesquisa, realizada pela empresa de tecnologia SoluCX no ano passado, registrou o índice concreto de satisfação e frustração do último emprego de 1,6 mil pessoas. Entre elas, só 39,9% deram notas de recomendação que os classificariam como promotores da antiga empresa. Mas uma a cada três (32,6%) se colocaram como detratores (o restante foi classificado como neutro). Na mesma pesquisa, 61,7% expressaram vontade de pedir demissão de seu emprego de então.

Embora no Brasil a legislação proteja marcas e empresas contra difamação de detratores em redes sociais, por exemplo, não há como interromper o movimento de insatisfação que fará mensagens ruins respingarem de volta na reputação da empresa. Gente insatisfeita não elogia, não sorri, não trata bem os demais. Seu desconforto, mesmo não anunciado – e não tenha dúvida que ele é expresso na família, na escola ou na mesa de um bar – é por vezes visível, traduzido em mau humor, desânimo ou baixa produtividade.

Por isso, tão importante quanto saber o que seus clientes pensam de você, é entender como sua equipe vê sua empresa por dentro e cuidar de seu público interno como um de seus melhores consumidores. Por que, afinal, eles serão a “cara” concreta de sua marca mundo afora.

Devo, não nego, pago quando puder

Valores reputacionais
e, mesmo assim, mantenho a simpatia em alta

O pedido de recuperação judicial da 123Milhas traz à tona a discussão entre o processo de renegociação de dívidas com credores e a reputação. O aumento do número de pedidos de recuperação judicial no primeiro semestre, e a possibilidade da manutenção do mesmo ritmo até o fim do ano, chama a atenção para a necessidade de sustentar um estoque reputacional para enfrentar o cenário financeiro desafiador.

Pesquisa da Serasa Experian mostrou que o número de pedidos de recuperação judicial, à qual empresas recorrem para negociar suas dívidas com credores, atingiu no primeiro semestre de 2023 o maior patamar dos últimos três anos, com alta de 52% sobre os seis primeiros meses de 2023.

O perfil das companhias e os motivos que as levaram a este passo variam. No topo, quatro grandes somam dívidas superiores a R$ 100 bilhões: Americanas, Oi, Light e Grupo Petrópolis, responsável por marcas como as cervejas Itaipava e Petra ou o energético TNT. Mas a maioria situa-se no segmento de micro e pequenas empresas. O setor de serviços é responsável por mais da metade dos pedidos de recuperação, seguido por comércio, indústria e setor primário.

Os motivos incluem desde reflexos da pandemia – em especial para o setor de serviços – até a alta de juros, afetando a capacidade de pagamento de consumidores e o desempenho do varejo, além do custo do crédito. Também pesam a alta das commodities, o desemprego persistente e a perda da renda. Como o cenário não deve mudar muito em curto prazo, é de se esperar que o movimento persista no mínimo durante o segundo semestre.

E o que leva a manter a reputação em alta nestes casos? Em primeiro lugar, tê-la construído anteriormente. Um exemplo é a rede Americanas. A contabilidade retorcida que acarretou o problema pode não influenciar em nada o desejo de um cliente pagar menos por algum produto disposto no marketplace online da marca. O mesmo pode se dizer do Grupo Petrópolis. Dificilmente um apreciador da Petra vai deixar de consumi-la pelo fato da empresa estar em maus lençóis financeiros.

No lado oposto, talvez, situem-se as fornecedoras de energia e telecomunicações (Light e Oi), setores afetados por dificuldades afeitas ao atendimento de número de consumidores na casa de dezenas de milhões e, mais recentemente, a 123Milhas, que antes de anunciar o processo judicial simplesmente avisou seus clientes que suas viagens já pagas estavam canceladas.

Enquanto as prestadoras de serviços públicos são beneficiadas por pouca concorrência, a empresa de turismo não tem a mesma sustentação. Sua principal bandeira reputacional era a prática de preços baixos. Que acabou não se sustentando e a empresa foi chamada para depor até na comissão parlamentar de inquérito (CPI) destinada a abordar pirâmides financeiras.

A bandeira amarela fica levantada para aquelas companhias, de qualquer setor e porte, com dificuldades financeiras indicando possibilidade de adotar este caminho no futuro. Até que ponto sua reputação é suficiente para obter as melhores condições de negociação junto a credores, por exemplo? Ou para manter funcionários motivados durante o período desafiador? Ou, ainda, ajudar a não só manter, mas atrair novos clientes?

A capacidade de construir um “colchão”, ou estoque reputacional, pode fazer a diferença. Isso depende de ações como avaliar com sinceridade seu ambiente – incluindo marca, empresa, produtos e serviços –, identificar detratores e oportunidades para construção de reputação positiva e meios de reforçá-la. Afinal, a força da reputação pode manter a empresa em alta, mesmo com suas finanças em baixa.

A culpa é do estagiário

A Culpa é do estagiário
Em agosto foi comemorado o dia do estagiário, no dia 18. A lembrança trouxe alguma percepção sobre o papel desta função e seu alcance para impactar a reputação corporativa.

Hoje empresas mais maduras, sejam de que tamanho forem, contam em sua maioria com programas de estágio, mais ou menos estruturados. Os mais profissionalizados entendem que essa posição será ocupada por pessoas a serem treinadas para absorverem cultura e processos corporativos o suficiente, de modo a prepará-las para posições chaves no futuro.

Hoje, inclusive, já se faz desse processo uma porta para ampliar ainda mais o coeficiente reputacional da empresa, aquele indicador sutil provocado por iniciativas que geram mais simpatia e apreço por parte dos diferentes públicos.

Quem não se lembra do terremoto causado pelo primeiro programa de estágio inclusivo do país, criado por Luiza Trajano e direcionado à contratação de pessoas negras? A inclusão, uma das bases do S do famoso tripé ESG, relacionado ao respeito da organização por aspectos ambientais, sociais e de governança, foi debatida como sendo restritiva ao grupo que representava a parcela masculina, branca e economicamente mais favorecida.

No polo oposto colocou-se como uma verdadeira bomba reputacional a entrevista de Cristina Junqueira, sócia do Nubank, quando afirmou em frente às câmeras do programa Roda Viva (TV Cultura – SP) que não contratava negros porque a organização não suportaria o nivelamento “por baixo” de seus profissionais.

De lá para cá as iniciativas inclusivas para equilibrar as contratações de estagiários e traines de acordo com a representatividade na população do país, reforçando a posição de grupos minorizados, multiplicaram-se pelo país. Além de contribuir para a questão ESG, o cenário espelha a preocupação com esses profissionais em início de carreira.

Mas também há quem busque nessa camada apenas uma possibilidade de contar com talento mal remunerado, sem acompanhamento ou ensinamento suficiente para prepará-lo para a vida profissional. E aqui, mais uma vez, é onde mora o perigo.

Além de inexperiente, a possibilidade do funcionário se sentir abusado ou injustiçado paira como ameaça no ambiente empresarial, facilitando por omissão, desatenção ou ignorância erros que podem levar à perda de grandes pontos do coeficiente reputacional.

Na verdade, ao fim e ao cabo, isso vale para qualquer contratação. E vale a pena dedicar algum tempo para pensar no valor de tornar cada colaborador um pilar da boa reputação corporativa. Desde cedo, pois quanto antes, melhor. A culpa nunca é do estagiário – ela é de quem o contratou e treinou (ou deixou de fazê-lo).

Referências:

Para saber mais sobre o programa de Trainee Magalu.

O valor do intangível

O valor do intangível
O impacto da reputação corporativa em valoração de empresas é inegável – e cada vez mais calculável

A mudança na composição do valor de mercado ao longo das últimas décadas é assunto que chama a atenção para o tema reputação. Isso porque em cerca de 50 anos os bens tangíveis de uma empresa, como lucros ou propriedades, que representavam cerca de 85% do valor corporativo em 1975, hoje ficam na casa dos 20% – o restante fica por conta de um bem intangível, mas cada vez mais calculável, que pode ser resumido como reputação.

O articulista Jonathan Knowles, fundador da consultoria Type 2, usou conhecimentos de finanças, estratégia e marketing para criar uma fórmula capaz de medir a participação de aspectos tangíveis e intangíveis no valor de uma empresa ou de um setor de negócios. Nas últimas três décadas, o valor dos bens tangíveis nunca ultrapassou a casa dos 50%. E, segundo ele, representam em média apenas 20,3% do valor de mercado médio de 2 mil empresas norte-americanas com resultados anuais acima de US$ 100 milhões, e 19% daquelas que superam US$ 5 bilhões.

O valor do intangível é hoje é aferido por empresas como Kantar, com alcance mundial, cujo ranking leva em conta desempenho financeiro e valor de marca. Na classificação da empresa, a lista Kantar BrandZ 2023 é liderada por negócios de base digital, como Apple e Google, seguidas por Microsoft e Amazon. Só em quinto lugar surge uma organização oriunda do mundo físico, McDonald´s.

Nas últimas três décadas, o valor dos bens tangíveis nunca ultrapassou a casa dos 50%. E representam em média apenas 20,3% do valor de mercado médio de 2 mil empresas norte-americanas

Em outra lista, da Brand Finance, focada no mercado norte-americano, as posições variam, mas a lógica segue a mesma. Os quatro primeiros lugares pertencem a Amazon, Apple, Google e Microsoft. Na quinta posição surge a Walmart, primeira ainda apoiada no mundo físico, mas com forte estratégia voltada para o e-commerce.  O mesmo cenário se repete no ranking setorial, liderado por tecnologia, varejo, mídia e serviços financeiros. Só em quinto lugar desponta uma indústria com raízes não virtuais, a automotiva.

A Amazon, por exemplo, perdeu cerca de US$ 50 bilhões em valor de marca principalmente por conta de avaliações menos simpáticas de seus consumidores no mundo pós pandemia.

Estes estudos só comprovam o tamanho da importância da reputação para uma empresa, marca ou produto. E mesmo gigantes sofrem com deslizes, mesmo que involuntários. Segundo a Brand Finance, a Amazon, por exemplo, perdeu cerca de US$ 50 bilhões em valor de marca principalmente por conta de avaliações menos simpáticas de seus consumidores no mundo pós pandemia. A pesquisa apontou o impacto de fatores como prazos de entrega mais longos na percepção do consumidor, que por conta disso se tornou menos propenso a recomendar a empresa.

E aí surgem questões que cabem tanto para empresas gigantescas quanto para aquelas menos portentosas. Elas vão desde a necessidade do acompanhamento de métricas de desempenho, inclusive aquelas oriundas de recomendações e lealdade de clientes pós compra (o famoso NPS, em inglês), até a boa gestão de redes sociais ou de reclamações de clientes.

Em um mundo gerido por relações digitais, a gestão e o posicionamento da empresa em redes sociais deve ser alvo prioritário. E aqui cabem alguns questionamentos.

  • Quais são os valores que a empresa quer expressar?
  • Eles correspondem à prática real da empresa ou há espaço entre os valores desejados e os atuais?
  • A estratégia para ir de um a outro já foi desenhada?

Além disso, a presença nas redes envolve desde a definição de uma “persona”, ou do cliente-alvo a quem se quer atingir, até qual tipo de mensagem a ser postada em cada rede e como, ou quanto, interagir (ou não) com manifestações de usuários.

Hoje, claro, existem ferramentas tecnológicas que ajudam a aferir métricas e até mesmo automatizar boa parte dos processos de presença e respostas nas redes. Mesmo assim, elas podem ser comparadas a um liquidificador, que só funciona para quem sabe a receita a ser preparada. No caso da reputação, não há ferramenta que substitua a estratégia. Sem isso, o resultado certamente não será palatável.

Da mulher de César ao cancelamento, as mudanças na reputação

Segunda esposa do imperador romano Julio César, no século que antecedeu o início da era cristã, Pompeia Sula perdeu o marido depois de um imbróglio sem sequer seu envolvimento. O responsável foi o jovem, Públio. Disfarçado de mulher para entrar em uma festa proibida aos homens, aparentemente para seduzir Pompeia, foi desmascarado, preso, processado e inocentado. Mas sobrou para ela e quando César se divorciou teria afirmado algo como

“à minha esposa, não basta ser honesta, tem de parecer honesta”.

O exemplo serve para comprovar que não só a reputação vem de longe, mas também a necessidade de aderência à forma como um indivíduo, instituição, empresa ou marca se constitui e quer ser reconhecido por terceiros. A contrapartida é o perigo de cair em contradição consigo próprio.

Outros ditos populares remetem à mesma situação. Por fora bela viola, por dentro pão bolorento. Fácil lembrar de uma empresa, por exemplo, que canta aos sete ventos seu amor pelo meio ambiente enquanto mata peixes envenenados em um rio ou enche os ares de gases poluentes.

O perigo é que a mentira tem pernas curtas, que estão correndo cada vez mais rápido. A velocidade digital expõe sinais antagônicos entre discurso e prática de maneira brutal, muitas vezes até à maneira da mulher de César, que, até onde se soube, nada tinha a esconder.

Possivelmente, ainda hoje a política do cancelamento ainda atinge mais indivíduos do que organizações. Pesquisa realizada pelo Datafolha no ano passado mostrou que 38% dos mais de 2 mil entrevistados em todo o país temem ser julgados pelo que postam na internet e um terço sobre de ansiedade para saber se suas postagens serão (ou não) bem aceitas. Há até quem promova cancelamento consciente. A organização Sleeping Giants, por exemplo, mostra a grandes anunciantes como suas marcas ajudam a sustentar discursos de ódio e preconceito, para “desmonetizar” seus difusores.

Imagem de Alexandra_Koch por Pixabay

Hoje, mais rápido do que antes, do dia para a noite uma reputação pode cair por terra. E haja trabalho para sua recuperação. Aqui, claro, cabe mais um ditado óbvio: é melhor prevenir do que remediar.

Estratégias, programas e ações voltadas a construir e sustentar a boa reputação devem compor qualquer estrutura organizacional. Da base ao topo. Das relações com acionistas a fornecedores e clientes, atravessando todos os processos organizacionais. Será que alguém se lembra qual a marca envolvida na morte de um cliente por seguranças dentro de uma loja? Talvez não. Mas, quem lembra, coloca em jogo a marca da loja, não da prestadora de serviços…

Pode ser que César tivesse em mente este cuidado total de ponta a ponta com a reputação de sua esposa. Reputação exige cuidado e alerta para riscos. Afinal, é de pequenino que se torce o pepino.

O G da questão

Empresas envolvidas nos temas ESG nem sempre dão a atenção devida ao aspecto de governança, o último da lista, mas não menos importante

Recentemente, a Vale ganhou manchetes por conta de CPIs no estado do Pará, uma estadual e uma municipal. O tema são questões tributárias relacionadas à categorização de ouro como subproduto do cobre, supostamente para reduzir a taxação do produto.

De fato, é assim que o produto aparece no balanço da empresa. Mas, pelo sim, pelo não, a gigante entregou ao órgão regulador do mercado financeiro norte-americano, a SEC, relatório contábil explicando enfrentar processos por conta da CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral), inclusive relacionados ao tema.

Um desafio, segundo depoimento do diretor jurídico da Vale à CPI estadual, é uma discussão jurídica a respeito da base de cálculo sobre a qual o tributo incide, o que dificulta a governança corporativa.

E aqui está o G da questão.

Enquanto o mundo se debruça sobre as questões sociais e ambientais definidas pelo conjunto ESG, a governança se tornou quase uma eminência parda – um assunto pouco debatido e deixado de lado inclusive por implicar, às vezes, em características contábeis e outras deste tipo.

Mas o assunto ganha relevância de tempos em tempos. A partir de 2001, a quebra de empresas como a Enron, nos Estados Unidos, levou à definição de regras mais estritas de auditoria e segurança na lei Sarbanes-Oxley, de 2002. No Brasil, a operação Lava-Jato acendeu o alerta para necessidade de gerenciar melhor as boas práticas de governança e compliance, ou o cumprimento a regras – de ambientais a éticas e sociais. Em dez anos, o percentual de empresas brasileiras listadas em bolsa com área de compliance para gestão de risco saltou de 39% para 69% registrados no ano passado.

A questão é que existem regras e regras.

Além de legislação, normas e que tais, existem aquelas mais sutis, aparentemente insignificantes, que acabam contribuindo para o tom positivo ou negativo do boca-a-boca, inquestionavelmente capaz de provocar impacto reputacional. Exemplos pequenos, como cuidar do respeito e da cordialidade como um fornecedor é atendido pela área de compras, o ambiente de convivência de funcionários, ou até mesmo incentivar líderes a serem no mínimo polidos com os colaboradores podem beneficiar tanto ou mais a reputação de uma empresa do que suas discussões tributárias.

Compliance vai adiante. É importante criar consciência sobre o cenário dentro de casa.

  • Qual o respeito da empresa pelas regras, estabelecidas ou sociais?
  • Qual a dose de mesquinharia que coloca na negociação com os fornecedores?
  • Quanto “espreme” seus funcionários?
  • Até que ponto lembra de parabeniza-los por alguma atitude inesperada, fora do manual, que deixou um cliente encantado?

Afinal, a reputação da empresa corresponde à visão de quem está fora dela. Mas cabe a ela conhecer e definir os pilares sobre os quais vai se assentar.

E, neste caso, é sempre bom lembrar do G da questão.

O impacto da sucessão, tema da novela em horário nobre, na reputação corporativa

Sucessão familiar
Quando uma empresa – e sua reputação – têm nome, sobrenome e marca, o momento da sucessão pode ser a grande oportunidade de apresentar o enriquecimento de seus valores

A novela Terra em Paixão, no ar em horário nobre da TV Globo, chama a atenção para um aspecto significativo em um enorme número de empresas nacionais de todos os portes: a passagem de bastão da liderança para a nova geração de companhias familiares.

A questão deve ser enfrentada estratégica, administrativa e legalmente o quanto antes e, claro, de maneira profissional. Mas um dos pontos que não pode ser deixado de lado, ou não receber a atenção devida, é a questão da reputação.

Quando uma empresa – e sua reputação – têm nome, sobrenome e marca, o momento da sucessão é crítico. Isso porque muitas vezes uma grande porção da reputação angariada ao longo do tempo está diretamente ligada ao dono da empresa, seu fundador ou patriarca, cujos valores construíram o negócio, garantindo sua sobrevivência e crescimento.

A questão é que uma nova geração, além de sustentar os valores primordiais da organização, traz consigo novos valores geracionais e, por vezes, até disruptivos, desde um olhar mais amigável a novas tecnologias e relacionamentos digitais até maior preocupação com questões relacionadas a ESG, aquelas envolvendo aspectos sociais, ambientais e de governança.

A oportunidade para ganho reputacional neste momento é gigante. É hora de reafirmar o quanto a empresa vai honrar suas origens, seja junto a funcionários, clientes, fornecedores, bancos, comunidades vizinhas ou quaisquer outros públicos de interesse (stakeholders). Mas também é momento de plantar a semente do futuro que se avizinha, sejam quais forem as novas diretrizes que uma geração mais jovem pode agregar à marca, produtos, serviços e, claro, à reputação construída cuidadosamente ao longo dos anos.

Vale a pena dedicar atenção a este detalhe, além de avaliar contratos, perfil e desejo dos sucessores e outras questões que chamam a atenção do público da telenovela. Afinal, a reputação é um bem intangível, mas precioso, cuja sutileza dificulta sua documentação, mas cuja solidez foi suficiente para ser um dos grandes pilares de apoio dos negócios no passado e deve ser mantida no presente e preparada para o futuro.

5 pontos de atenção para a reputação de pequenas e médias empresas

Riscos de imagem que podem ser crises controláveis para grandes empresas têm poder devastador para as de pequeno e médio porte. A boa notícia é que agora elas têm alternativas para ajudar a resolver a questão.

Há quem diga que ser adulto é resolver problemas. O mesmo pode ser aplicado a empreendedores e empresas – e com mais ênfase naquelas de pequeno e médio porte onde boa parte das decisões e soluções estão concentradas em poucos sócios ou no dono do negócio.

É claro que, mesmo com tanta coisa para fazer, mesmo os pequenos estão preocupados com reputação e imagem. E mais: muitas vezes essa preocupação é ainda mais aguda em empresas cujo fundador, ou dono, até por não ter um nome empresarial de peso por trás, atrela seu próprio nome – e reputação – à empresa, com necessidade ainda maior de zelo para que as coisas não se misturem.

O desafio é que, afogados num dia a dia massacrante, e por achar que não possuem tempo ou recursos para se dedicar a cuidados formais com reputação, aumenta o risco de deixar escapar alguns detalhes que vão se somando e assumindo capacidade de provocar dissabores mais à frente.

Até fica fácil entender os casos em que a crença, e o esforço, ficam voltados exclusivamente para a qualidade em si do produto ou serviço – que, por serem tão bons, falam por si, sem necessidade sequer do mínimo, como propaganda.

A questão é que boa parte destes problemas chegam a ser provocados por quesitos alheios ao controle do empresário, mas podem acarretar, em última instância, até mesmo ações judiciais. Problemas na entrega de mercadorias ou serviços, descumprimento de contratos envolvendo terceiros, reclamações indevidas (ou não) com viralização nas redes sociais estão entre situações prosaicas com poder de impactar empresas com menor poder de fogo para arcar com os custos de uma defesa, dentro ou fora de instâncias legais.

E é aí que mora o perigo. Uma empresa de pequeno e médio porte pega desprevenida em alguma situação que ganha escala inesperada terá mais dificuldade por falta do colchão de reservas a que uma grande organização recorrer para enfrentar alguma crise. Além disso, sua reputação pode ficar publicamente marcada.

Quem nunca consultou, pelo menos uma vez, a fama de alguma empresa ou produto em portais como Reclame Aqui? Pois então. Conquistar e manter a boa reputação é uma ação que surte muito mais efeitos quando adotada de forma preventiva do que de forma curativa.

Avaliar a imagem da empresa junto a seus públicos de relacionamento (stakeholders, para os mais sofisticados), desde empregados até o gerente do banco, faz parte deste processo. Ajustar a auto avaliação ao pensamento externo, avaliar processos que possam abrir brechas na qualidade pretendida e até definir valores internos pelos quais se guiar são algumas etapas necessárias.

Até que ponto um pequeno empresário sabe, exatamente, como um motoqueiro se relaciona com seu cliente no aguardado momento de recebimento de um produto? Ou qual sua relevância para que prazos prometidos por fornecedores de produtos e serviços sejam cumpridos? Ou, ainda, como fazer de sua reputação um capital que valorize sua empresa ou sua oferta frente aos olhos alheios?

As respostas para essas questões podem ser encontradas com maior ou menor facilidade pelos próprios empresários e suas equipes. O desafio é a multiplicidade de pontos de contato, ou interações, entre empresas, marcas, produtos e serviços e todos os públicos envolvidos. Em um restaurante, por exemplo, podem ser o garçom ou uma avaliação no Trip Advisor. Secretárias, ex-clientes e até o Serasa ajudam a criar (ou não) a reputação de uma indústria fornecedora de insumos. Varejistas podem perder vendas e serem alvo de críticas públicas por um meio de pagamento fora do ar.

Para preservar a empresa e afastar ameaças como essas, existem algumas ações que podem ser úteis. Neste artigo começamos com os riscos mais comuns:

  1. Colaboradores – como são tratados, qual o grau de satisfação com a empresa; como se relacionam com clientes e fornecedores; qual o índice de reclamações com relação ao atendimento e a erros no trabalho. Funcionários, que mesmo sem o conforto de um sobrenome corporativo famoso, têm orgulho de trabalhar numa empresa que lhes dá demonstrações práticas de respeito – tanto por eles mesmos quanto pela opinião positiva de clientes.
  2. Fornecedores – qual a origem das matérias-primas e produtos que sua empresa comercializa. O seu modelo de trabalho, ou a forma como negocia, o respeito a cada aspecto tratado, a lisura no relacionamento frequente e até a busca de negociações justa, sem regatear em excesso só para ganhar pontos em esperteza e uns trocados extras, seja com contratados ou terceiros, podem ser somados às garantias que eles oferecem em relação a problemas de fornecimento e origem de matérias-primas.
  3. Processos internos – os fluxos de trabalho estão mapeados e divulgados e as pessoas conhecem como proceder em cada uma das rotinas necessárias ao bom andamento do trabalho. Há alguma forma de contingência em caso de problemas durante a realização das atividades.
  4. Controles – é muito importante separar os controles financeiros, materiais e de recursos humanos da empresa e das famílias controladoras da empresa. A mistura da vida empresarial e privada causa problemas de difícil solução posterior.
  5. Especialistas – em caso de dúvidas, conte com especialistas para auxiliá-los na detecção de riscos e planejamento da reputação da empresa.

Preconceitos, ilusões coletivas, valores e reputação

Preconceito e Reputação empresarial

Racismo, homofobia, misoginia, capacitismo e etarismo estão entre preconceitos pretensamente inexistentes no mundo das marcas. Mas, no mundo real, deixam feridas em pessoas, grupos e reputação.

Eventos como o ataque sofrido pelo jogador brasileiro do Real Madrid, Vini Jr, em partida contra o Valencia no Campeonato Espanhol de Futebol não são incomuns. Nem posicionamentos como o da La Liga, que organiza a disputa, e até de seus patrocinadores, entre eles gigantes mundiais como Microsoft, Puma e Santander.

O repúdio do governo brasileiro e a prisão de torcedores manifestamente racistas mostra que o aparato institucional funciona com mais rapidez e assertividade do que as empresas. Afinal, em tese, uma empresa não é racista. Nem um país. Entretanto, ambos são compostos basicamente por um punhado de pessoas reunidas, seja por atividade ou localização geográfica.

E estas sim, podem ser preconceituosas. Racistas, homofóbicas, misóginas, capacitistas, etaristas e qualquer outro tema que seja possível conceber. A disparidade entre a auto avaliação e a visão do preconceito como estando presente apenas no outro foi retratada em 2020 em pesquisa do PoderData, no Brasil, mostrando que embora 79% entre 2,5 mil entrevistados considerassem haver racismo no país, só 39% admitiam fazer parte do grupo com preconceitos contra negros.

Mesmo com movimentos das marcas em prol da diversidade interna e até publicitária, a questão ainda tem muito a evoluir. A busca de inclusão de grupos minorizados, aqueles cuja representatividade populacional não é refletida em espaços de poder, como empresas ou política, tem sido impulsionada por questões como necessidade de acelerar a inovação a partir de visões diversas sobre uma mesma questão, aderência à agenda ESG ou mesmo retratar nas mídias o apreço por tais grupos.

Entretanto, o esforço de mudança cultural é gigante, demorado e, neste meio tempo, o preconceito tem o poder de impactar a reputação de empresas e marcas. Como separar a imagem dos patrocinadores do presidente da La Liga, que criticou o jogador vítima de racismo? Afinal, a ligação das marcas em busca de glórias reputacionais relacionadas a qualquer evento valem só para o bem?

É claro que o mundo muda lentamente. Mas manter a reputação em alta exige movimentos mais ligeiros. No mínimo, para se posicionar em relação a questões que possam ferir alguém por preconceito, seja qual for. Notas curtas de repúdio à manifestação de preconceito ou racismo, divulgadas dias depois do ocorrido, podem não ser suficientes e arranhar o capital reputacional a duras penas conquistado.

Afinal, a base da reputação serão os valores que qualquer empresa assume como seus, e da objetividade com que se liga a eles. O olhar externo muitas vezes pode ser útil neste campo, para entregar visão sem os vieses internos. O racismo pode ser um valor que a empresa queira assumir, sem dúvida. Mas não cai bem, não é mesmo?

Por outro lado, deixar de compactuar com preconceitos pode ser um ativo reputacional relevante para empresas e marcas que buscam papel ativo e consciente na sociedade em que se inserem. Neste caso, agir do lado contrário, tratando a questão como ilusão coletiva ou de importância menor, não atenderá os anseios dos grupos atacados e de quem se solidariza com eles.

Como enfrentar períodos de retração no varejo

O planejamento financeiro e comercial pode não ser suficiente para suportar momentos desafiadores: construir e sustentar a boa reputação é um dos pilares da sobrevivência

O varejo tem estado em pauta e nem sempre por bons motivos. A série de pedidos de recuperações de gigantes do ramo e índices de desempenho tímidos invadiram noticiários, motivaram memes em redes sociais e expuseram marcas até então ilibadas. Mas o cenário trouxe oportunidade de colocar em foco o papel da reputação em períodos desafiadores.

Os próprios processos de recuperação valorizam a questão reputacional. No famoso exemplo da Americanas, um dos primeiros passos da recuperação judicial foi obter permissão para pagar antecipadamente R$ 192 milhões a credores trabalhistas e pequenos fornecedores. Um pingo d´água no oceano de R$ 43 bilhões de dívidas, mas que apaziguou duas classes de credores em prol da reputação, afastando, digamos, grupos de ex-funcionários em protesto diante de lojas. A reputação também é essencial para sustentar acordos extrajudiciais, escolha da varejista de luxo Amaro para lidar diretamente com seus credores com suporte judicial mínimo, já que o cuidado na relação com sua cadeia de fornecedores vai definir o grau de sucesso das tratativas.

Em momentos de crise ou retração, a preocupação com o impacto na imagem e na reputação se impõe. A confiança do mercado minimiza stress com financiadores, evita exigências antecipadas de credores e temeridade por parte dos clientes.

Foto de Patrick Tomasso na Unsplash

O questionamento sincero de como a empresa, suas marcas e seus produtos e serviços são vistos pelo mercado é um dos primeiros passos. As respostas coincidem com a identidade imaginada pela própria empresa, com o que ela faz de verdade ou com seu suposto DNA? A forma como ela se coloca ao mercado (sua marca) corresponde a como ela é vista por clientes, agentes financeiros, empregados? Um segundo passo é fazer estas expectativas convergirem.

No caso do varejo, o exercício começa a se tornar questão de sobrevivência. Empresas hoje em dificuldades certamente teriam visto o descompasso entre estas camadas, caso tivessem de dedicado a isso. Talvez a reputação superasse a realidade das ações, em alguns casos. Em outros, o equilíbrio reputacional em relação às outras dimensões pode ter ajudado a encontrar saídas menos sangrentas.

Empresas do setor precisam levar em conta que o ambiente que criou as dificuldades não desaparecerá magicamente do dia para noite. Os juros de dois dígitos continuarão a assombrar empresários que contraíram dívidas quando os índices estavam baixinhos. Somados à inflação elevada, contribuirão para manter consumidores conscientes de suas limitações (quando não inadimplentes).

A reputação pode ajudar. Afinal, a confiança na empresa, calcada na forma como ela faz negócios e se coloca no mercado, pode beneficiar renegociações financeiras, manutenção do fornecimento em dia, engajamento de funcionários no sucesso do negócio e atratividade de compradores. A melhor notícia é que hoje os interessados contam com especialistas no tema e não precisam lidar com isso sozinhos.

Afinal, cada organização, empresa ou marca tem peculiaridades únicas, como identidade única marcada por questões como história, cultura, método de trabalho ou estilo pessoal dos dirigentes, toda avaliação acarretará diagnósticos e propostas de ação diferentes. E só a partir da familiarização profunda com esta realidade é que tem início o processo para otimizar o “encaixe” da empresa com o mercado em que ela atua para melhores resultados. Avaliar o tema em sua próxima análise de planejamento pode ser uma boa ideia.